Reconhecendo Yeshua no Partir do Pão

Reconhecendo Yeshua no Partir do Pão

14 de Julho, 2021 0 Por Getúlio Cidade

No artigo anterior, apresentamos a milenar bênção do pão e sua importância no milagre da multiplicação realizado por Yeshua. Vamos prosseguir nesse tema e analisar essa bênção em outros episódios dos Evangelhos, reconhecendo Yeshua no partir do pão.

O primeiro grande milagre da multiplicação dos cinco pães e dois peixes repercutiu por toda a região próxima a Tiberíades, na Galileia. O capítulo 6 de João nos conta que, logo no dia seguinte, a multidão saíra em busca do Senhor. “Então alguns barcos de Tiberíades aproximaram-se do lugar onde o povo tinha comido o pão após o Senhor ter dado graças. Quando a multidão percebeu que nem Jesus nem os discípulos estavam ali, entrou nos barcos e foi para Cafarnaum em busca de Jesus.” João 6:23,24

Aqui se registra algo relevante das raízes judaicas no ministério de Yeshua que, na maioria das vezes, passa despercebido dos que leem essa passagem. A dinâmica do milagre da multiplicação se dá “após o Senhor ter dado graças”, ou melhor dizendo, após Ele recitar Hamotzi, a milenar bênção do pão. (Leia aqui para saber mais). Assim, ao contrário do que se possa pensar, Yeshua não orou por milagre algum ou “abençoou o pão” como dizem algumas traduções, mas apenas recitou a bênção do pão, uma sentença simples de gratidão a Deus, aquele “que faz o pão brotar da terra”.

Quando a multidão o encontra do outro lado do mar, porém, é confrontada com a sinceridade do Senhor que lhe diz que ela o busca não pelos sinais miraculosos em si, mas porque eles comeram do pão e se fartaram. É a pura verdade ainda hoje, quando muitos buscam a Deus não porque desejam conhecê-lo ou ter comunhão com Ele, mas porque querem ter satisfeitas suas necessidades materiais apenas. E esse é o ponto de partida para outro grande sermão de Yeshua, registrado apenas no livro de João (Yochanan), o discípulo amado, aquele que comia pão ao lado do Mestre e provavelmente o que melhor o conhecia.  

Em seu discurso, Yeshua vai além da necessidade física do pão e aponta para outro tipo de alimento: o pão da vida que é capaz de sustentar o espírito e produzir vida eterna ao que dele come. Em menção ao milagre do dia anterior, fazendo uma comparação ao alimento físico que perece, Ele aponta para si mesmo, o único capaz de saciar a alma faminta eternamente. “Então Jesus declarou: ‘Eu sou o pão da vida. Aquele que vem a mim nunca terá fome […]’” João 6:35. E acrescenta: “Todavia, aqui está o pão que desce do céu, para que não morra quem dele comer. Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Se alguém comer deste pão, viverá para sempre. Este pão é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo”. João 6:50,51

Ao apontar para si como o Pão da Vida, Yeshua estava fazendo referência à Torá, a um trecho muito bem conhecido de todos os judeus que o ouviam: “nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca do Senhor” Deuteronômio 8:3. De modo interessante, Yeshua também se identificou com o “pão que brota da terra”, pois ele ressuscitou da terra para nos dar a vida eterna. Assim, a bênção do pão tem um duplo significado para os judeus que creem no Messias Yeshua. Ao dar graças pelo pão físico, os que confessam seu nome também agradecem por um pão muito superior ao da matéria-prima do trigo: o Pão da Vida.

“TOMAI E COMEI”

Yeshua também recitou a bênção do pão em uma ocasião muito especial, aliás, a mais especial de todas: na última vez em que comeu com os discípulos. O que entre os cristãos ficou conhecido como A Última Ceia, especialmente por causa do quadro do pintor renascentista Leonardo da Vinci, foi, na verdade, o seder de Pesach, a refeição feita no início do primeiro dia da Páscoa, quando se inicia a celebração dos Asmos.

Aquela foi a refeição mais importante de todas e a mais almejada por Yeshua, pois Ele sabia que seria morto em uma cruz durante o início da Páscoa e, portanto, aquele seder era revestido de um profundo significado, não apenas para os discípulos, mas para todos os milhões e milhões que o seguissem nos séculos subsequentes.

No momento de instituir a Ceia do Senhor dentro da refeição do seder, Yeshua “tomou o pão, e abençoando-o, partiu-o, e o deu aos discípulos, e disse: Tomai, comei, isto é o meu corpo” Mateus 26:26. Aqui, mais uma vez, Ele não abençoa o pão, mas recita a bênção do pão que diz: “Bendito és Tu, Senhor nosso Deus, Rei do universo, que faz o pão brotar da terra”. O Senhor se identifica com o próprio pão dessa antiga bênção judaica. Os discípulos certamente se lembraram do sermão de João 6, especialmente Yochanan que, mais tarde, registraria essas palavras em seu Evangelho: “Pois a minha carne é verdadeiramente comida […] Quem de mim se alimenta, viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu […]” (João 6: 55,58).

Tal qual no milagre da multiplicação, Ele recitou Hamotzi, partiu o pão e deu aos discípulos que dele comeram. Entretanto, as multidões que receberiam aquele Pão multiplicado não estavam naquela sala de jantar, mas espalhadas por Jerusalém, Judeia, Samaria e por todos os cantos do mundo; por todas as nações, povos e raças; e por todos os séculos até o fim. Elas receberiam do Pão da Vida partido e distribuído aos discípulos naquela noite pelo próprio Senhor, e elas mesmas comeriam dele e o distribuiriam a outras multidões, levando a vida eterna a todos os que creem no Filho de Deus.

NO CAMINHO DE EMAÚS

A bênção do pão ou Hamotzi foi tão marcante na vida e no ministério de Yeshua como era e ainda é na vida de qualquer judeu religioso hoje que não come pão sem antes recitá-la. Ele declarava essas mesmas palavras todos os dias, antes de todas as refeições, quer fosse em local reservado, junto somente com os discípulos, ou abertamente em público, como foi no milagre da multiplicação dos pães.

O capítulo 24 do Evangelho de Lucas contém uma das histórias mais fascinantes ocorridas após a ressurreição do Senhor que é seu encontro com os dois discípulos na estrada de Emaús. Esses homens, ainda muito abalados pelos acontecimentos que levaram Jesus à cruz, estavam se dirigindo àquele vilarejo próximo de Jerusalém e conversando sobre “tudo o que havia sucedido” (v. 14). Ainda estavam entorpecidos pelos fatos que presenciaram na cidade durante aquela festa de Páscoa. Seus corações estavam pesados de profunda dor e tristeza. De repente, o próprio Senhor se aproxima, caminha com eles e se junta à conversa.

“Mas os olhos deles estavam como que fechados, para que o não conhecessem”
Lucas 24:16. É estranho imaginar que aqueles homens que, embora não fossem do círculo dos doze, mas que também eram discípulos, não puderam reconhecer o Senhor após ressurreto. Podemos especular várias coisas, mas as Escrituras afirmam simplesmente que “seus olhos estavam como que fechados”. Isso comprova que não dependia dos discípulos reconhecerem-no ou não, mas de um poder alheio a eles, fora de seu controle. Esse poder invisível emanava do próprio Messias ressurreto que não desejava se revelar enquanto caminhavam e conversavam.

O mesmo se deu no reencontro de José com seus irmãos no Egito. Eles não podiam reconhecê-lo, durante todo o tempo em que estiveram juntos, até o momento que José resolveu se revelar a eles. Eles estiveram diante do irmão que venderam como escravo muitos anos antes, mas eram incapazes de reconhecê-lo, pois seus olhos também “estavam como que fechados”. José aqui é um tipo de Cristo que se revela a seus irmãos no momento oportuno, no tempo exato de Deus, sem atraso ou adiantamento.

Assim foi com aqueles discípulos a caminho de Emaús. Eles estavam diante do Senhor, caminhando a seu lado, ouvindo sua voz em uma explanação da Torá e de todos, sim, todos os profetas (v.27), o que deve ter sido uma das mensagens messiânicas mais fabulosas e eloquentes de todas as eras. No entanto, eram incapazes de reconhecê-lo, não porque não desejassem, mas porque seus olhos “estavam como que fechados”.

Esse é o estado atual de Israel como nação. Embora haja muitos cristãos messiânicos dentro e fora de Israel que compõem o corpo de Cristo, o povo como um todo é incapaz de reconhecer Yeshua como seu Messias. Isso porque seus olhos estão “como que fechados” até que se cumpra a plenitude dos gentios, quando o próprio Messias virá para livrá-los da destruição no fim dos dias. Então, Yeshua se revelará a eles e “todo Israel será salvo” (Romanos 11:25-26).

Ao se aproximarem do vilarejo, Yeshua continua a caminhar como se fosse para mais longe. E por que Ele fez isso? Porque queria ter  a certeza de que os discípulos desejavam sua companhia. Yeshua era e continua sendo extremamente educado, e nunca entrará em nenhum coração ou nenhum lar, a menos que seja convidado.

“Quando estava à mesa com eles, tomou o pão, deu graças, partiu-o e o deu a eles.
Então os olhos deles foram abertos e o reconheceram, e ele desapareceu da vista deles”
Lucas 24:30,31 (NVI). Ao dar graças, Yeshua recitou Hamotzi ou a bênção do pão, parte o pão e o entrega aos discípulos. É exatamente nesse momento que seus olhos que, durante todo esse tempo, “estavam como fechados” são abertos e eles o reconhecem.

Eles reconheceram Yeshua justamente ao ouvi-lo pronunciar a bênção do pão, a mesma que, durante três anos e meio, eles o ouviram recitar inúmeras vezes. Não tinha como não reconhecer aquela voz proclamando aquelas palavras milenares da bênção, tão familiares a eles, não apenas a voz, mas a entonação, a cadência da fala, a maneira de erguer o pão, partir e distribuir aos presentes para mais uma refeição. Não havia momento mais propício de se revelar àqueles discípulos de quem tão pouco conhecemos, mas a quem certamente o Senhor muito amava.

O momento da refeição era um dos prediletos de Yeshua, pois comer junto é sinônimo de comunhão, e é exatamente no partir do pão que Ele decide “abrir-lhes os olhos” e se revelar. Que bela imagem deve ter sido aqueles discípulos reconhecerem Yeshua ressurreto, o Pão da Vida, no momento preciso em que recebiam o pão físico de suas mãos!

Ao proclamar a bênção do pão naquelas palavras milenares em hebraico, mesmo após a Ressurreição, Yeshua mostrou que, ainda que recebendo todo poder e autoridade do Pai, continuava um autêntico judeu, conservando suas raízes judaicas. É Ele quem nos concede o pão diário que faz brotar da terra para saciar nossa fome física. E é Ele também o próprio Pão da Vida que desceu do céu, foi morto e ressuscitou, “brotando da terra” para salvar todo aquele que nele crê.


Leia também a parte 1 desse artigo em:

A Milenar Bênção do Pão

Leia mais:

O Segredo de Deus

Jesus e a Língua Hebraica – Parte 2

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