
Tu b’Shvat – o Ano Novo das Árvores
Encontramo-nos no mês de Shvat que é marcado por uma data pouco conhecida dos cristãos gentios, mas rica na tradição judaica e com profundo significado espiritual. Trata-se de Tu b’Shvat — o ano novo das árvores — um marco no meio do inverno de Israel usado para determinar o plantio bem como o dízimo do fruto das árvores a ser apresentado a Deus.
No calendário judaico, os dias são marcados pelas letras do alfabeto que possuem valores numéricos. O dia que marca o início do ano das árvores é feito com a combinação das letras ט (tet), cujo valor numérico é 9, e ו (vav), cujo valor é 6. As duas letras formam a palavra טו (tu) e somam 15 que é o dia do feriado. Portanto, Tu b’Shvat significa o dia 15 do mês de Shvat, início do ano novo das árvores em Israel. Essa data sempre coincide com janeiro/fevereiro do calendário gregoriano.
Falar em ano novo de Israel nessa época pode causar certa confusão. Na verdade, há quatro datas que marcam um tipo de ano novo no calendário judaico. Em Êxodo 12, o Senhor determinou a Israel que observasse o princípio da contagem dos meses a partir de 1º de Nisan, o mês de Pesach (Páscoa). Esse é o início do ano religioso a partir do qual se estabelece a sequência das Festas do Senhor. A contagem do ano civil é a partir de 1º de Tishrei ou Rosh HaShanah que comemora a criação do homem. Em Tishrei também se comemora as demais Festas do Outono e, a partir dele, marcam-se os anos sabáticos (shemitah) e os anos de Jubileu. O Talmude estabelece ainda o ano novo que marca o dízimo dos animais, iniciando-se em 1º de Elul, mas que deixou de ser observado após a destruição do segundo Templo, uma vez que não há mais sacrifício de animais.
Tu b’Shvat — o ano novo das árvores — não consta na Torá e aparece na Mishna por volta do século II d.C. O fruto da árvore produzido antes dessa data pertence ao ano anterior e seu dízimo não deve ser dado junto com o fruto produzido após ela. Tornou-se uma tradição, em Israel, plantar árvores por todo o país em Tu b’Shvat, o que explica as mais de 240 milhões de árvores nativas do Oriente Médio que têm sido contabilizadas pelo Fundo Nacional Judaico desde o início do século XX.
Isso também explica o fato de Israel ser um caso raríssimo de um país que tem mais árvores no presente do que no passado. Após os hediondos ataques do Hamas, em 7 de outubro de 2023, mantendo essa tradição, familiares das vítimas assassinadas no festival Nova plantaram árvores em memória de seus entes queridos nos locais onde seus corpos foram encontrados.

FIDELIDADE APRESSADA
A data de Tu b’Shvat se dá no meio do inverno no hemisfério norte, quando a seiva começa a subir e percebe-se o movimento dos primeiros brotos na terra. É como se a natureza antecipasse a temporada de primavera adiante. Por isso, Tu b’Shvat marca o renascimento das árvores na Terra Santa. A primeira das árvores a florescer nessa época é a amendoeira. Em pleno inverno, seus brotos começam a saltar aos olhos em meio a uma paisagem árida, de troncos secos e galhos desfolhados castigados pelo frio.
Embora as Escrituras não falem em Tu b’Shvat, o Senhor usa a imagem da amendoeira — o principal símbolo dessa temporada — para falar com Jeremias. “Veio ainda a palavra do Senhor, dizendo: Que vês tu, Jeremias? Respondi: vejo uma vara de amendoeira. Disse-me o Senhor: Viste bem, porque eu velo sobre a minha palavra para a cumprir” (Jr. 1:11-12). A palavra para amendoeira é shaqued e para o verbo velar é shoqued. Ambos são escritos da mesma forma (שקד), diferenciando-se apenas pela vocalização. Deus faz um jogo de palavras aqui para se comunicar com o profeta. Ele está dizendo a Jeremias que, assim como a amendoeira é diligente e se apressa em florescer na frente das demais árvores, Ele é diligente sobre sua Palavra e se apressa em cumpri-la.
O verbo traduzido por velar possui o significado de vigiar, estar alerta e atento. Na antiguidade, era o mesmo verbo usado para uma sentinela que guardava os muros da cidade, ou para o agricultor que vigiava a terra e sabia o momento certo de semear, ou para o pastor que vigiava as ovelhas. A amendoeira, por ser a primeira árvore a florir ao despertar da letargia do inverno, é um símbolo de vigilância e prontidão.
É assim que Deus cuida de sua Palavra para cumpri-la. Apenas no contexto das raízes judaicas é possível compreender as palavras de Deus a Jeremias. Quando chega o meio do inverno em Israel e a paisagem é preenchida pelos pontilhados branco e cor-de-rosa dos brotos das amendoeiras, essa Escritura poética e profética vem automaticamente à mente de quem a conhece, enfatizando a fidelidade apressada do Senhor para cumprir o que prometeu.

ESPERANÇA DE RENOVAÇÃO
Em vários pontos das Escrituras, o ser humano é assemelhado a árvores e, por isso, os sábios acreditavam que Tu b’Shvat também marca o renascimento para os homens, um avivamento da alma. Isaías 61 nos chama de “árvores de justiça, plantação do Senhor”. O Salmo 1 compara aquele que tem prazer na Torá do Senhor a uma árvore plantada junto a ribeiros de águas que dá seu fruto na estação apropriada e cujas folhas não caem. O Salmo 92 declara que o justo florescerá como a palmeira e crescerá como o cedro do Líbano, plantado na casa do Senhor e florescendo em seus átrios. O próprio Yeshua declarou ser a Videira verdadeira e o Pai, o Agricultor. Nós somos seus ramos a serem cuidados, podados para produzir frutos (Jo. 15:1-2).
O inverno é um tempo de nuvens escuras e céu cinza. Justamente quando se chega na metade da estação, Tu b’Shvat é um sinal de renovo da natureza não apenas para as árvores do campo, mas também para os homens. É um tempo de se renovar as esperanças e ganhar novos sonhos, de aceitar o desafio de voos mais altos, acima das nuvens escuras. Quantas lições aprendemos nessas datas festivas ligadas à natureza e ao ciclo produtivo da terra! Esse é também um tempo de se bendizer a Deus pelos sete frutos da terra (Dt. 8:8) e de orar por sua bênção sobre o restante do ano que temos pela frente, para que o Senhor abençoe a obra de nossas mãos e nos prospere em cada empreitada e desafio.
A árvore é símbolo de resistência e força, assim como de esperança, pois pode crescer após ser cortada. Essa é uma imagem do homem em sofrimento que consegue se reerguer após um duro golpe e reviver para cumprir seu propósito. Jó era um homem experimentado no sofrimento e retratou esse poder de resiliência da árvore que, mesmo cortada, consegue se renovar e brotar seus rebentos. Ainda que sua raiz se envelheça na terra e seu tronco morra no chão, ao cheiro das águas, brotará e de si nascerão ramos como a planta nova (Jó 14:7-9). As águas são uma figura da Palavra de Deus e do Espírito Santo. Por mais profundo que seja o corte, se o homem estiver em contato com essas águas, reviverá.

O DESERTO FLORESCERÁ
Tu b’Shvat – o ano novo das árvores — ganha suma importância quando entendemos que um dos maiores sinais da restauração de Israel que apontam para a vinda do Messias se dá no cumprimento das promessas de Deus em relação ao florescimento do deserto. A referência aqui é ao Neguev, o principal deserto do país que ocupa mais de 60% do território israelense. A promessa de restaurar o povo de Israel à sua terra é acompanhada pela promessa de florescimento do deserto. Há 700 anos a.C., Deus prometeu essa transformação na paisagem desértica por intermédio de Isaías: “O deserto e os lugares secos se alegrarão; o ermo exultará e florescerá como a rosa. Abundantemente florescerá, e também exultará de alegria e romperá em cânticos” (Is. 35:1-2).
Após o renascimento de Israel, no século XX, essa profecia se cumpriu literalmente; o deserto floresceu com diferentes espécies de árvores, plantas e flores. O país desenvolveu técnicas eficazes de cultivo para áreas desérticas que o elevaram ao patamar de uma das maiores potências industriais de tecnologia agrícola. Suas startups do setor estão entre as maiores do planeta em termos de inovação tecnológica, especialmente no que se refere a sistemas de produção e irrigação. De fato, Israel produz um excedente de frutas, vegetais e flores que lhe permite exportar para o mundo todo, mesmo sendo um país minúsculo em termos geográficos.
Em praticamente todas as estações, é possível ver, no Neguev, as mais variadas plantações, árvores de pistache, acácia e cedro, por exemplo, bem como diversas espécies de flores tais como lírios, narcisos e anêmonas, entre outras. Atravessar o deserto do Neguev é testemunhar as Escrituras de Isaías saltando diante de nossos olhos, é ver uma terra outrora desértica transformada em uma paisagem rica, verdejante e exuberante; um verdadeiro milagre da era contemporânea.

“Mas vós, ó montes de Israel, vós produzireis os vossos ramos e dareis o vosso fruto para o meu povo de Israel; porque está prestes a vir” (Ezequiel 36:8). Com base nessa profecia, a tradição rabínica afirma que, quando a terra de Israel produzir alimento de forma abundante, esse é um fenômeno inegável do fim dos dias e da proximidade da vinda do Messias. Sendo a agricultura moderna de Israel, alavancada por forte tecnologia, uma das mais avançadas do mundo, que produz de modo abundante para atender sua população e ainda exportar alimentos, essa profecia já se cumpre em nosso tempo. Portanto, esse é mais um sinal de que o Rei está às portas.
O RAMO DE JESSÉ
Não há como falar em Tu b’Shvat e não fazer menção à árvore que Deus elegeu para representar a nação de Israel — a Oliveira Natural — que abriga em si os ramos naturais (judeus) e os de zambujeiro (gentios), enxertados nela por intermédio de Yeshua. Essa é a árvore que Deus escolheu para glorificar seu nome e onde nos inseriu para sermos participantes da raiz e da seiva da Oliveira (Rm. 11:17). Se a amendoeira representa a diligência e a fidelidade de Deus em cumprir sua Palavra, a oliveira representa sua entrega e seu amor. Assim como a oliva é prensada e moída para produzir azeite, o Filho de Deus foi prensado na moenda do Pai e Agricultor a fim de dar vida ao mundo, derramando sobre os que nele creem o óleo de seu Espírito.
A essência de Tu b’Shvat está no próprio nome do Messias que é comparado a um ramo proveniente do tronco de Jessé (Is. 11:1). A palavra ramo (נצר — netzer) está ligado a Nazaré (נצרת — Natzrat), cidade natal de Yeshua. Jesus de Nazaré em hebraico — Yeshua MiNatzrat — carrega a mesma raiz de netzer, pois Ele é o Ramo de Jessé. É daí também que se origina a palavra notzri, traduzida por cristão. Literalmente falando, cristão é um ramo pequeno, caule ou broto, oriundo do ramo maior — o ramo de Yshai (Jessé).
Voltando ao texto de Jó, a árvore, após cortada, parece morta, mas, em contato com o cheiro das águas, ela revive e faz nascer seus brotos, crescendo novamente. Esse também é um puro retrato de Yeshua — o ramo de Jessé — que “foi cortado da terra dos viventes” (Is. 53:8), mas ressuscitado pelo Espírito Santo, representado pelas águas. Essas são as mesmas águas vivas do rio que fluem do interior de todo aquele que nele crê (Jo. 7:38), gerando frutos na estação própria para a vida eterna.
Leia também:
Jerusalém – o Cálice de Atordoamento
Hanukkah – a Coragem para Brilhar a Luz
