
A Páscoa e o Cálice Escondido
O mês de Nisan se aproxima da metade, inaugurando as Festas da Primavera com Pesach — a Páscoa do Senhor. Neste ano, gostaria de compartilhar um tema ainda desconhecido, porém relevante, cujo propósito é produzir uma reflexão a respeito da redenção de Israel nos últimos dias. Essa redenção repousa na conexão entre a Páscoa e o cálice escondido do seder.
No ano de 2021, após inaugurar nosso blog em Purim, o primeiro artigo da Páscoa que publicamos — A Páscoa e os Quatro Cálices do Seder — despertou um interesse enorme, uma vez que esse era um assunto desconhecido da grande maioria dos cristãos gentios (hoje nem tanto). Esse ainda é um dos artigos mais lidos em nosso site que já ultrapassou a marca dos 33 mil acessos. Aqueles que leram o volume 1 de A Oliveira Natural sabem que esse tema é explorado no capítulo da Páscoa do Senhor de modo profundo e parece ser ilimitado em revelação.
No entanto, a questão do cálice escondido não foi abordada. O motivo é que a revelação desse cálice está ligada à história de José e seus irmãos no Egito, e este tema é abordado apenas no último capítulo do volume 2 de A Oliveira Natural. Portanto, é esse cálice escondido que desejo trazer para nossa meditação nesta Páscoa. O mais interessante e desafiador para quem se interessa e estuda as Festas do Senhor é que o cálice escondido é um elo entre as Festas da Primavera — ligadas à primeira vinda do Messias — e as Festas do Outono, ligadas à segunda vinda.
CÁLICE DAS SALVAÇÕES
O terceiro cálice do seder é o cálice da salvação. Lemos sobre ele em vários pontos das Escrituras, incluindo a Brit Hadashah (Novo Testamento). Mas a passagem que diretamente o identifica na Tanach é o Salmo 116. Este é um dos salmos que compõem o Hallel, cantado nas Festas do Senhor de longa duração, Páscoa (primavera) e Tabernáculos (outono). Também é cantado na noite da refeição do seder de Pesach.
“Tomarei o cálice da salvação e invocarei o nome do Senhor.” (Salmos 116:13). O original para “cálice da salvação” é כּוֹס־יְשׁוּעוֹת (cos yeshuot). Curiosamente, a palavra salvação está no plural e o nome literal é “cálice das salvações”. Isso chamou a atenção dos sábios antigos que discutiram seu significado. O Midrash registra que um antigo sábio afirmou que se trata de dois cálices da salvação, um reservado para os dias do Messias e o segundo para os dias de Gogue,[1] ou seja, para os tempos de angústia de Jacó no fim dos dias.
O primeiro cálice da salvação foi tomado pelo Messias em sua primeira vinda. Foi com ele que Yeshua instituiu a Ceia do Senhor. Os quatro cálices do seder revelam quatro estágios da redenção do povo do Egito, conforme mencionado em Êxodo 6:6-7. O terceiro é o cálice da salvação, cuja expressão é “Eu vos redimirei” (וגאלתי — ve’gaalti). Após comer o matzah, que Yeshua identificou como sendo sua carne, Ele tomou o terceiro cálice e declarou:
“Bebei dele todos. Isto é o meu sangue, o sangue da nova aliança (Brit Hadashah), que é derramado por muitos, para remissão de pecados. E digo-vos que, desta hora em diante, não beberei deste fruto da vide, até àquele dia em que o beba de novo convosco no Reino de meu Pai” (Mt. 26:27-29).

Yeshua o bebeu fisicamente com os discípulos, em seu último seder, mas teve de bebê-lo espiritualmente, sozinho em sua Paixão. Sabia que, para salvar o mundo, precisaria tomar esse cálice com muita dor física e emocional, lágrimas e sangue. Ele esteve a ponto de desistir perante o pavor de tamanho sofrimento e por isso orou, no Getsêmani, para que o Pai passasse de si esse cálice. Mas foi fortalecido e encorajado por um anjo, e pôde tomá-lo para que pudéssemos receber sua tão grande salvação.
Esse cálice coincide com o que diz o Midrash, pois foi erguido e bebido nos dias do Messias, e continua a ser bebido ainda hoje por todos os salvos que creem em seu nome até que cesse a plenitude dos gentios. Resta ainda o segundo cálice da salvação e esse é o cálice escondido, a ser revelado na redenção do remanescente de Israel, nos últimos dias.
O CÁLICE DE JOSÉ
A história de José e seus irmãos no Egito tipifica a história de Yeshua e seus irmãos judeus. Como mencionado, esse tema é profundamente explorado no último capítulo do volume 2 de A Oliveira Natural. Semelhantemente ao primeiro encontro de José com seus irmãos, o primeiro encontro de Yeshua com Israel foi cercado de ciúme, inimizade e desavenças. O segundo encontro ocorreu em meio a profunda angústia, porém, terminou com reconciliação. Esse encontro está prestes a se repetir e será a reconciliação de Israel com seu Messias.
O instrumento usado por José para trazer angústia e comoção entre seus irmãos foi seu próprio cálice de prata. Ele determinou a seu despenseiro que o colocasse no saco de mantimento de Benjamim. O cálice permaneceu escondido aos olhos de seus irmãos no saco do irmão caçula e, quando foi revelado, trouxe um desespero tal que fez com que rasgassem suas vestes, um sinal de luto e pesar. O motivo não foi a alegação do roubo do cálice, mas a consequência que sabiam que ele traria sobre si. O real motivo foi a rejeição de José por parte deles. Todos tiveram essa plena consciência de que seu pecado contra José os alcançava por intermédio daquele cálice escondido.
Sua rejeição por José, causada por puro ciúme e inveja, gerou seu exílio forçado no Egito. Essa foi a opção encontrada por Judá para salvá-lo dos demais irmãos que queriam matá-lo. Assim, concordaram em vendê-lo para uma caravana de ismaelitas a caminho do Egito. O peso desse pecado terrível estivera por 22 anos em sua consciência. Estavam plenamente cientes de que aquele cálice escondido no saco de Benjamim era apenas o motivo de Deus levá-los a juízo. Isso se exprime nas palavras de Judá a José: “Que diremos a meu senhor? Que falaremos e como nos justificaremos? Achou Deus a iniquidade de teus servos” (Gn. 44:16).

O mesmo Judá implora para ficar como escravo no lugar de seu irmão caçula, com quem fora encontrado o cálice de José. Isso não foi por acaso, mas sendo o ancestral do Messias, Judá é um tipo profético usado para salvar e remir seus irmãos, primeiro José, depois Benjamim. Essa salvação temporária aponta para a salvação de seus irmãos judeus pelo Messias no fim dos dias.
Judá rasga seu coração perante José, agora o homem mais poderoso da Terra, abaixo apenas de faraó. Em nome de seus irmãos, ele demonstra a dor de seu arrependimento. É nesse ponto que José se revela a eles. O perdão foi imediato, seguido de reconciliação com abraços, beijos e muitas lágrimas. O mesmo cálice escondido por José que trouxe à tona o pecado escondido dos irmãos, no fim, trouxe também perdão e reconciliação. As doze tribos de Israel estavam agora restauradas.
O CÁLICE DE YESHUA
Há uma íntima relação entre o cálice de José e o cálice da salvação bebido e compartilhado pelo Messias com os discípulos. Ambos falam de redenção. O cálice escondido no saco de Benjamim trouxe sofrimento e dor, mas foi necessário para trazer arrependimento e reconciliação, bem como salvar toda a família de Jacó da morte pela fome. O cálice da salvação do Messias também foi amargo para si, mas Ele o bebeu quando o Pai o ofereceu, a despeito do profundo sofrimento, pois era necessário a fim de trazer salvação e reconciliação com os homens, livrando da morte eterna todos os que nele confiam.
Entretanto, esse é um cálice duplo, conforme o Salmo 116. O outro cálice contém uma segunda salvação e permanece oculto aos olhos de Israel, ainda hoje, para ser revelado nos últimos dias (acharit hayamim). Esse é o mesmo terceiro cálice que tem estado por milênios, a cada Pesach, nas mãos do povo judeu, ao celebrar a noite de seder, desde que foi tirado do Egito com mão forte e braço estendido. Esse é o mesmo cálice que cristãos do mundo inteiro têm celebrado há dois mil anos, na Ceia do Senhor, instituída por Yeshua na noite de seu último seder.
O cálice de José esteve escondido aos olhos de seus irmãos para trazer expiação (כפרה —kaparah) e redenção (גאלה — gueulah), duas palavras-chaves nas promessas de Deus para Israel na Tanach. Esse cálice da salvação, que também pode ser chamado de cálice de Yeshua, está agora escondido aos olhos de Israel, mas em breve será revelado, a fim de trazer expiação e redenção.
Assim como seus irmãos pensavam que José morrera e foram surpreendidos, assim será nos dias de Gogue, quando o remanescente de Israel estiver passando pelas Dores de Parto do Messias. Yeshua, a quem reputam como morto, será gerado para seu povo mediante muito sofrimento e tribulação, como ocorreu no Egito com os filhos de Jacó, e eles o verão por fim.
Ele se revelará à Casa de Davi e aos habitantes de Jerusalém (descendentes de Judá), que chorarão sobre Ele, como choraram os irmãos de José após sua revelação, conforme Zacarias 12:10. Eles beberão do cálice escondido de Yeshua, com gosto amargo no início, mas capaz de trazer reconciliação com o Mashiach de Israel.

Ao beber desse cálice misterioso em seu último seder, Yeshua afirmou que não o beberia novamente até que o fizesse conosco no Reino de seu Pai. Uma das formas de interpretar isso é que a salvação completa e o Reino de Deus sobre a Terra só se dará após a reconciliação e salvação de Israel. Por isso o Salmo 116 o chama de cálice das salvações. Yeshua ainda o beberá novamente no fim dos dias, após se revelar a seus irmãos judeus, juntamente com Israel. Esse é um grande mistério ligado ao cálice escondido do Messias.
Na próxima vez que estiver participando do seder de Pesach ou celebrando a Ceia do Senhor, lembre-se disso quando beber do cálice de Yeshua, fazendo memória dele e anunciando sua morte até que Ele venha (1Co. 11:25-26). O cálice da salvação está ligado diretamente à segunda vinda do Messias e à restauração de Israel. Uma coisa não ocorrerá sem a outra. Baruch shem k’vod Malchuto le’olam va’ed! (Bendito seja o nome de honra de seu Reino para todo o sempre!)
[1] Bereshit Rabbah 88:5.
Leia também:
Jerusalém – o Cálice de Atordoamento

Boa tarde, muito obrigada pelo estudo, muito bem explicado, muito profundo mesmo.
Deus te abençoe. Que o Senhor traga mais luz para nós entendermos essa Palavra. Você é um
instrumento do Senhor. Amém.
Querida Graça,
Obrigado pelas palavras gentis. Que Yeshua lhe conceda conhecimento e sabedoria de sua Palavra.
Shalom e bênçãos!